quarta-feira, 28 de abril de 2010

Dicas para turbinar um i-pod

Dia desses, um amigo me falava de uma conhecida que queria dicas para turbinar seu i-pod.

Não sei se a tal amiga lê o Vitrola Encantada, mas vou me fazer de expert, e dar uns conselhos para a moça:

Misture alguns cantores contemporâneos com veteranos, procurando sempre ver o paralelo entre eles. Por exemplo: se vai baixar o neo-hippie Devendra Banhart, baixe também David Crosby, Os Mutantes ou os discos do início da carreira de Caetano Veloso.

Banhart faz um som totalmente calcado na liberdade e no experimentalismo sonoro do final da década de 60 e início da de 70.

Fã incondicional do Tropicalismo, o cantor já declarou diversas vezes seu amor por Caetano e pela primeira banda de Rita Lee. Vale a pena ver como as loucuras de uns se infiltram nos sons do outro.

Recomendo fortemente o disco Cripple Crow, um caleidoscópio de psicodelismo viajante e viciante. O último, What Will We Be, embora menos diversificado, também vale uma checada.

Procure mesclar estilos diferentes. Dessa forma, durante uma caminhada, você não corre o risco de só escutar MPB ao apertar o shuffle. É muito legal escutar sequências díspares, coisas absolutamente opostas, velharias e novidades.

Música é para causar estranhamento, chamar a atenção, despertar lembranças etc. Assim, não se limite ao que você conhece. Experimente um cantor argentino ou uma banda de rock islandesa.Se você nunca escutou Scott Walker, com certeza vai ficar surpreso com o estilo cinematográfico, orquestral, às vezes bizarro, desse cultuado artista britânico. Comece pelo quarto trabalho solo de Walker, Scott 4.

Experimente, também, o som progressivo, lento e frequentemente triste da banda Sigur Ros, vinda diretamente da gelada Islândia. Ou então a rica musicalidade do músico argentino Kevin Johansen e o pop esperto dos também argentinos do Miranda. Pode não ser para todo mundo, obviamente, mas vale muito à pena conhecer.

E já que a rede virou, com o perdão da palavra, uma verdadeira putaria, aproveite para conhecer coisas que eu, por exemplo, tive que esperar ter meu próprio dinheiro para comprar os importados.

Hoje está tudo a um click de distância. Com uma conexão legal e um disco rígido espaçoso, se pode montar uma enciclopédia musical em poucas semanas.

Mas não faça como certas pessoas que eu conheço: têm quarenta mil músicas no HD, porém não sabem explicar a diferença entre gospel e soul. Ou separar um bom samba de um pagode mauricinho. Se não for para escutar e curtir, melhor nem ir atrás.

Afinal, música exige recolhimento, reflexão, contato íntimo entre ouvinte e canção.

Para mim, felizmente, ainda é assim.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Mini-Guia: The Rolling Stones

Pedras preciosas:

Exile On Main Street (1972)

Presença constante em listas de melhores discos já gravados, Exile On Main St. é o auge do período mais criativo e brilhante do grupo.

Gravado entre Los Angeles e uma villa no sul da França, este antológico álbum duplo é cercado de lendas sobre os excessos químicos e sexuais cometidos pelo grupo. Mito à parte, o disco permanece uma verdadeira aula magna de rock, blues, country, soul e gospel.

Beggar´s Banquet (1968)

A batucada que abre a emblemática Simpathy For The Devil pavimenta o caminho para uma seleção quase toda acústica, mas não menos bombástica. Altamente antenado com sua explosiva época, Beggar´s é um dos registros mais contundentes de uma banda encontrando sua identidade musical.

Sticky Fingers (1971)

Da capa ultrajante concebida por Andy Warhol, até a coleção de clássicos que inclui Brown Sugar, Sister Morphine e Bitch, este disco não erra em absolutamente nada. Quase 30 anos após seu lançamento, Sticky Fingers é tão atual e imprescindível hoje como era então.

Semi-preciosas:

Black And Blue (1974)

Este disco é, possivelmente, o último grande disco gravado pelos Stones. No repertório variado pululam novas influências, como o reggae e o funk. Para completar, duas das melhores baladas compostas por Jagger/Richards: Memory Motel e Fool To Cry.

Aftermath (1966)

Primeiro álbum em que a dupla Mick Jagger/Keith Richards assina todas as composições, Aftermath suaviza o blues rock dos discos anteriores em favor de uma pegada mais pop. Não por acaso o grande sucesso do álbum é uma canção meio chorosa, a balada Lady Jane.

Their Satanic Majesties Request (1967)

Tentativa frustrada de fazer um álbum no espírito psicodélico da época, este disco pouco conhecido dos Stones é tido como a “resposta” do grupo a Sgt. Peppers, dos Beatles. Ouvido hoje, o que sobressai é a beleza de canções como She’s a Rainbow – em arranjo barroco e elaborado – e 2.000 Man – esta regravada pelo Kiss no álbum Dinasty.

Bijuteria:

A Bigger Bang (2006)

Se este foi o último disco de estúdio dos Stones – como grande parte da imprensa noticiou à época do lançamento – é forçoso dizer que eles encerraram a carreira com um disco nota zero. Baladinhas bregas, rocks feitos sob medida para estádios e outras bobagens compõem um álbum que não se equipara sequer ao pior da produção da banda na década de 1980.

Flashpoint (1991)

De todos os discos ao vivo gravados pelos Stones, este é, talvez, o pior. Apesar de participações especiais de peso – Eric Clapton empresta sua guitarra iluminada para Litte Red Rooster, um dos poucos bons momentos – o disco nunca chega a decolar plenamente.

terça-feira, 20 de abril de 2010

As meninas de Brasília

Mesmo com tantos motivos pra deixar tudo como está
E nem desistir, nem tentar
Agora tanto faz
Estamos indo de volta
Pra casa.


A cantora Elis Regina, em seu auge, era conhecida como pimentinha. Após sua morte, a jornalista Regina Echeverria escreveu uma célebre biografia na qual a definia como furacão.

Quem viu, alguns anos mais tarde, uma jovem cantora exorcizando seus demônios em salas de espetáculos minúsculas de Brasília, presenciou o surgimento de um novo furacão. Atendia pela alcunha de Cássia Eller e cantava com a mesma intensidade e paixão um rock do Legião, um blues de Jimi Hendrix, um soul de Otis Redding ou um samba de Noel Rosa.

Não era perfeita. Tinha uma queda quase fatal por certo exagero que seu gogó privilegiado lhe permitia. Mas era uma artista em constante busca e seus últimos trabalhos mostram um tênue equilíbrio entre o grosseiro e o delicado.

Ouvi-la cantando Relicário com o autor da canção, Nando Reis, é um momento perfeito, mas também doloroso, quando se pensa que, pouco tempo depois dessa gravação, ela viria a falecer.

Como escreveu Renato Russo (outro compositor que Cássia gravou bastante): é tão estranho/os bons morrem antes...

Assim como Cássia, a carioca Zélia Duncan iniciou sua carreira pelos bailes e bares de Brasília.

Na época ela nem era Duncan. Era apenas Zélia Cristina. Na volta de uma temporada no exterior, já com o sobrenome de solteira da mãe agregado a seu nome artístico, Zélia encantou o país com seu timbre de voz inusitado e uma versão em português da música Cathedral Song, da cantora Tanita Tikaran.

O auge artístico veio com o álbum apropriadamente chamado Sortimento, um disco que jogava no mesmo balaio rap, samba, rock e pop.

No disco ao vivo que se seguiu, Zélia presta uma bela homenagem a Renato Russo e a Cássia Eller na dobradinha Quase Sem Querer/Por Enquanto, ao mesmo tempo em que rememora seus tempos de Brasília.

A primeira década dos anos 2000 não acrescentou nenhuma grande cantora à cena nacional saída de Brasília. Resultado, talvez, de uma estagnação cultural e artística na cidade.

Enquanto o Distrito Federal cresce assustadoramente, seu público continua vivendo das migalhas caídas do eixo Rio-São Paulo.

Quem sabe em algum boteco suarento por aí não esteja surgindo uma intérprete da qualidade de uma Cássia Eller ou de uma Zélia Duncan...

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Os Meninos de Brasília

As ruas têm cheiro de gasolina e óleo diesel
Por toda a plataforma, toda a plataforma
Você não vê a torre

O clássico do Capital Inicial, com letra do trovador solitário, Renato Russo, é codificada para os não moradores da Capital Federal.

A tal plataforma é a do terminal rodoviário, que marca o centro da cidade e delimita as duas asas.

A torre é a Torre de TV, um dos cartões postais de Brasília, que abriga um mirante que proporciona a melhor vista do traçado urbano imaginado por Lúcio Costa e, no térreo, uma feira de artesãos que, nas décadas de 70 e 80, ficou conhecida como feira hippie. Hoje, descaracterizada como tudo o mais na cidade, é simplesmente a feira da Torre.

Legião Urbana, Capital Inicial e Plebe Rude formam uma espécie de santíssima trindade do rock made in Brasília.

Os Paralamas do Sucesso, que por vezes são associados à cena brasiliense dos anos 80, foram formados e começaram sua carreira no Rio de Janeiro.

Outras bandas se lançaram na esteira do grande sucesso desses três grupos: Finis Africae, Peter Perfeito e a punk Detrito Federal.

Ninguém, no entanto, conseguiu chegar perto do reinado estabelecido por Renato e seus legionários.

O culto que começou ainda na época do Aborto Elétrico estendeu-se por todos os rincões deste imenso país e, ainda hoje, o Legião é um dos maiores vendedores de discos de sua gravadora.

Geração após geração, toda uma nova meninada segue descobrindo os versos muitas vezes sublimes do atormentado poeta do desencanto e da revolta.

Depois desta turma, o Brasil viu a ascensão do rock dos Raimundos, que misturavam guitarras pesadas com ritmos populares, baião e forró. Tiveram seus momentos, é verdade, mas a essas alturas eu já havia perdido o interesse no rock feito no Brasil.

Para mim, a pobreza dos textos, o sexismo de algumas bandas e a falta de vocalistas carismáticos e inteligentes esvaziaram qualquer tesão que eu pudesse ter em relação a estas bandas.

Com a cidade prestes a completar 50 anos – na próxima quarta, dia 21 de abril de 2010 – fica a pergunta:
Brasília ainda conseguirá gerar outro Renato Russo?

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Cantoras e mais Cantoras

Já que ando numa fase de falar muito sobre cantoras, gostaria aqui de recomendar três trabalhos, três vozes maravilhosas, três mulheres inesquecíveis:

1- Soldier Of Love. Sade
Após uma longa ausência dos estúdios, a anglo-nigeriana volta com sua habitual elegância e sutileza. Acho que Sade é uma das cantoras mais incompreedidas de todos os tempos.

Uma parte cretina da crítica a rotulou como representante da geração yuppie, uma intérprete chique mas vazia de alma. Absurdo!

Sade pode se orgulhar de ter aberto uma nova trilha para cantoras que investem mais no canto calmo, emotivo e sublime. Sem gritos e sentimentalismos exagerados. Mais ou menos a trilha seguida pela minha segunda dica...

2- The Sea. Corinne Bailey-Rae
Marcada pela morte do marido, Bailey-Rae fez neste seu segundo trabalho uma obra mais intimista e pesada que sua estreia, marcada por canções abertamente radiofônicas como Put Your Records On e Like A Star.

A voz continua cheia de nuances, pequenos detalhes que revelam dor, frustração e também alegria. Sentimentos que abundam na obra da minha terceira indicação...

3- To Be Free. Nina Simone
É difícil dizer qualquer coisa nova sobre um artista do porte de Nina Simone.

Falar que ela foi pioneira na luta pelos direitos civis dos negros, que rasgou sua alma muitas vezes diante de audiências estupefatas, que fez versões definitivas para clássicos como Ne Me Quites Pas, Feeling Good, I Put A Spell On You, Don't Let Me Be Misunderstood e Wild Is The Wind, isso todo mundo já disse.

Mas fazer o quê? Ela permanece um dos tesouros da música do século XX. Descobri-la e resdescobri-la é mais que um prazer. É uma necessidade.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Carta a Noemia

Cara Noemia,

Não sei se você se lembra de mim, mas lá pelos idos de 1981, 1982 eu era a sua Dora.

Explico-me: Dora é a personagem interpretada por Fernanda Montenegro em Central do Brasil, uma professora aposentada que engorda a mirrada pensão escrevendo e lendo cartas para iletrados que passam diariamente pela Central do Brasil, no Rio de Janeiro. Pois bem: eu era a sua Dora.

Você trabalhava como babá de uma criança de aparência angelical e comportamento de capeta chamada Filipe. Quando não estava correndo como uma louca atrás de Filipinho, você assistia à sua televisão em preto-e-branco, ouvia músicas no rádio portátil e se correspondia com seus parentes no Norte e com seu namorado no Rio de Janeiro.

A bem da verdade, esta última parte quem fazia, mesmo, era eu. Sim, porque você era aquilo que se costumava chamar de analfabeta de pai e mãe. Era eu, com minha letra infantil de garoto de 11 anos, quem escrevia sobre o seu cotidiano na Capital Federal, trabalhando em casa de família e juntando seu dinheirinho para ir para o Rio se casar com o Manuel.

Também não sei se você se lembra, mas era no seu minúsculo quartinho que nos divertíamos ao som dos seus cantores favoritos: Carlos Alexandre e Sidney Magal.

Você nunca foi de ficar chorando dores de amores ao som de Fernando Mendes ou de Paulo Sérgio. Melhor esquecer da chatice da labuta ao som da Ciganinha ou da Cigana Sandra Rosa Madalena. Ou então sentir-se A Feiticeira ou uma daquelas loucas Frenéticas - outra paixão sua.

E, pensando bem, eu te devo algo do meu gosto por música. Foi no apartamento de seus patrões, quando eles estavam fora, que eu ouvi pela primeira vez um disco inteiro de Simon & Garfunkel (um gravado ao vivo no Central Park, se não me engano) e um de Elton John (uma coletânea daquelas que se faziam especialmente para o mercado nacional e que continha Skyline Pigeon, uma música que me transportava para muito, muito longe).

Pois é, querida. Não sei se você se casou mesmo com o Manuel, se tiveram filhos, se aprendeu a ler e se ainda se alegra quando ouve O Meu Sangue Ferve Por Você.

O que eu sei é que muitos daqueles momentos que vivi com você, em minha infância, jamais se apagarão da memória: nem o poster do Roberto na parede, nem a primeira novela mexicana na telinha, nem o seu sorriso largo e expansivo.

Um beijo grande!

Sua, Dora.

Cafonas, Canalhas e Cachorros

Emocionante, curioso, por vezes engraçado, mas antes de qualquer coisa, extremamente profundo e ousado, o livro do jornalista e historiador Paulo Cesar de Araújo, Eu Não Sou Cachorro, Não - Música Popular Cafona e Ditadura Militar, Ed. Record, 2002, é um documento fundamental para se entender a história recente da música brasileira.

No seu intrincado, porém jamais complicado, jogo de conexões entre os tempos barra pesada dos anos de chumbo dos governos militares e a difícil tarefa de centenas de artistas brasileiros de tentarem produzir sua arte sem esbarrar na famigerada censura, surgem anedotas, histórias surpreendentes e, sobretudo, casos reveladores da personalidade de nomes hoje considerados monstros sagrados da nossa MPB.

Enquanto artistas classicamente etiquetados como de esquerda como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Gonzaguinha passaram para a História como mártires de um período de violenta perseguição e de atentado contra a liberdade de expressão artística, outros como Waldick Soriano, Odair José, Agnaldo Timóteo e Nelson Ned entraram no imaginário coletivo como cantores de gosto duvidoso, bregas, cafonas. Pior: eles foram, numa época de cerceamento das liberdades individuais e coletivas, considerados artistas alienados, colaboracionistas e apáticos.

Araújo coloca, com precisão e coerência, todos estes mitos por terra: nem os chamados artistas de esquerda foram tão destemidos e corajosos assim ( a cantora Elis Regina, por exemplo, chegou a gravar uma propaganda especialmente encomendada pelo Governo), nem os chamados cafonas de direita foram artistas alienados e cegos para a triste realidade brasileira. Muitas de suas músicas, inclusive, sofreram pesado processo de censura, fazendo com que artistas como Odair José e Waldick Soriano tivessem que prestar contas junto a órgãos oficiais e, em alguns casos, fazer mudanças de última hora em suas letras.

Mais que tudo, o que o imenso preconceito que cerca a obra destes artistas revela é o, até agora, intransponível abismo social que separa a elite letrada da imensa massa de analfabetos, esfomeados e sub-empregados desta Nação.

O desprezo que, tanto a classe média de formação universitária, quanto os formadores de opinião (imprensa, críticos e historiadores) demonstram sentir pela música dita cafona é, no fundo, o desprezo que se sente pelas empregadas domésticas, os porteiros, os pedreiros, os peões de obras e os milhões de anônimos que, muitas vezes, têm como sua única fonte de alegria os sons transmitidos em AM em seus radinhos de pilha.

Leiam, leiam, leiam!

domingo, 11 de abril de 2010

Norah, a que não vendeu a alma

Falar em evolução em termos de música pop é sempre um perigo. O que pode parecer crescimento e desenvolvimento para uns, para outros pode simplesmente soar como falta de rumo e desespero criativo. Então, não vou falar da evolução de Norah Jones, no seu novo trabalho, The Fall.

Grande parte da crítica simplesmente se referiu à virada "roqueira" do novo disco de Jones. Obviamente, não se trata de um disco de rock. Só porque as guitarras aparecem em maior quantidade e o disco segue um ritmo mais encorpado, não quer dizer que esta tímida novaiorquina tenha virado uma Janis Joplin.

Mas ela mudou, disso não há dúvida. Talvez tenha sido a recente separação de seu companheiro. Talvez tenha chegado aquele famoso momento de encruzilhada artística que todo grande artista atravessa (e, sim, para mim, ela é uma grande artista), não sei...

O que não deixa de se insinuar aos meus ouvidos é a qualidade das composições de Norah, de como ela está mais madura e segura como compositora, de como sua voz soa cada vez mais bela, cativante e apaixonante.

Se isso quer dizer evolução, já são outros quinhentos, mas diante do pálido pastiche que foi seu álbum anterior, este The Fall se revela uma gratíssima surpresa!

domingo, 4 de abril de 2010

O Sinatra de Sheffield

Há artistas tão bons e tão talentosos que a gente fica a se perguntar porque ainda não se tornaram fenômenos de massa, grandes vendedores etc. Talvez seja melhor assim...

Talvez se um músico como Richard Hawley, um inglês de voz aveludada e sinuosa que já lhe valeu o apelido de Frank Sinatra de Sheffield - cidade natal de Hawley - , tivesse obtido um sucesso estonteante logo no início de sua carreira, não teríamos a beleza, a sutileza e a quase perfeição de discos como Coles Corner, Lady's Bridge e o último, Truelove's Gutter, possivelmente seu disco mais intimista e difícil.

Queridinho da crítica inglesa, Hawley compõe discos únicos no panorama da música pop contemporânea: luxuosas baladas em arranjos cuidadosamente elaborados que revelam uma riqueza escondida em pequenos detalhes. Pairando, magnífica, acima de tudo, está a voz quente e acolhedora de Hawley, um instrumento capaz de despertar emoções intensas (em The Ocean, de Coles Corner), envolver o ouvinte no mais deslavado romantismo (em Open Up Your Door, do último LP) e, às vezes, atingir momentos de uma quase alegria (Tonight The Streets Are Ours, de Lady's Brigde, seu melhor e mais variado trabalho).

É bastante possível que, devido ao prestígio e ao culto gerado em torno de sua obra, Hawley siga lançando discos lindos e maravavilhosamente antiquados por um bom tempo.

Sorte de quem já descobriu este gogó privilegiado. Para quem nunca nem ouviu falar, fica a dica: Hawley é o melhor cantor surgido nas ilhas Britânicas nos últimos vinte anos. E cá para nós, melhor ainda que Sinatra...