segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A Animação e a Diversidade Sexual

Por Lázaro Luis Lucas


Enquanto a telenovela brasileira e todos os demais programas produzidos neste país ainda insistem em tratar da diversidade sexual da maneira mais lamentável possível - seria melhor que ignorasse solenemente a questão -, a produção em animação, seja para a TV ou cinema, realizada em todo mundo livre, vem surpreendendo cada vez mais.

Produções como Barry e a Banda das Minhocas (Dinamarca, 2008), concebidas para entreter o público infanto-juvenil, adolescente e adulto, vêm fazendo um excelente trabalho de inclusão de personagens homossexuais nas tramas. Até mesmo os vilões homossexuais estão repletos de carisma.Se houver alguma dúvida, é só acompanhar algum episódio das primeiras temporadas de As Meninas Super-Poderosas.

Outras séries produzidas para a TV que também apresentam tramas sobre a diversidade sexual ou personagens fixos de orientação homossexual são Du, Dudu e Edu, Coragem - O Cão Covarde e Os Padrinhos Mágicos. Ficando apenas naqueles que mais me impressionaram.

No caso de Coragem - O Cão Covarde, por exemplo, um episódio inteiro tratava do amor entre duas felinas, impossibilitado por um gângster que mantinha uma delas cativa, usando uma máscara sem qualquer personalidade. Com a ajuda do assustado cãozinho, ambas conseguem fugir do vilão e ao término acompanhamos a partida delas em um trem rumo à felicidade pretendida. Por fim, a câmera ainda foca a máscara destruída no chão. Uma ousadia para os nossos padrões e um belo exemplo de respeito às diferenças.

Por fim, não se pode deixar de falar nos longas-metragens e na série de TV Lilo e Stitch. Na minha opinião, a franquia mais gay friendly de que se tem notícias. Simplesmente, deliciosa.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O Insustentável Peso do Som

Acho impressionante que uma banda de mais de três décadas de atividade, que já perdeu seu carismático vocalista original e sempre foi acusada de repetir o mesmo som disco após disco, continue atraindo multidão a seus shows e, mais surpreendente ainda, continue vendendo muitos discos numa época em que ninguém mais se dá ao trabalho de comprá-los.

É o caso da banda australiana AC/DC, que se apresenta hoje, na cidade de São Paulo , num show que teve ingressos esgotados à velocidade da luz.

O que há de tão especial na banda de Angus Young e Brian Johnson? A princípio, nada. Mas, numa análise mais cuidadosa, há tudo.

O AC/DC é um caso raríssimo de uma instituição roqueira. Eles, há muito, transcenderam o simples rótulo de banda de hard rock e se inseriram no imaginário da história do rock, como somente as grandes bandas conseguem. Do grupo de garagem que tinha um guitarrista excêntrico, eles acabaram se tornando um mito, um símbolo de molecagem e fé no ideário rock’n’roll.

Encontro paralelo somente nos Ramones, com a diferença de que o grupo nova-iorquino nunca atingiu os números impressionantes alcançados pelo AC/DC.

Contra o grupo há o batido argumento de que são repetitivos e acomodados. Bobagem. Ainda que não tenham gravado nada de realmente relevante desde Back In Black, disco de 1980, o AC/DC segue perfurando tímpanos e encantando garotos bitolados e coroas beberrões. Para estes, a trilha sonora ideal ainda é um bom duelo de guitarra entre os irmãos Young.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A Última Flor

Há muito se discute sobre as reais qualidades literárias de uma boa letra de música. É poesia ou não? A coisa se complica muito quando música e texto de altíssima qualidade andam de mãos dadas. É o caso de grande parte da música brasileira.

Uma recente enquete da edição nacional da revista Rolling Stone revelou que Construção, música e letra de Chico Buarque, é a melhor canção brasileira de todos os tempos.

Se formos analisar os versos de Buarque, fica muito claro que a eleição de sua obra-prima, de 1971, deve muito à rica construção gramatical, cheia de versos terminados em palavras proparoxítonas, e suas metáforas asfixiantes da dura realidade do Brasil dos anos de chumbo.

É lógico que o incrível arranjo, que evolui de um simples samba para um épico cinematográfico em brilhante tecnicolor, torna a canção ainda mais impressionante, mas quando pensamos em Construção nos vem imediatamente à cabeça A Letra.

Para mim, não há mistério. Não consigo ver muita distinção entre Carlos Drummond de Andrade e a melhor produção de Caetano Veloso ou entre a depuração lingüística de João Cabral e o intricado universo de Chico Buarque.

Algumas letras de Antonio Carlos Jobim me emocionam tanto quanto os versos tristes alegres de Manuel Bandeira.

As palavras de Renato Russo tiveram um impacto tão grande em minha psique quanto os versos românticos de Álvares de Azevedo e Castro Alves.

Penso que, num país de analfabetos e alfabetizados que não lêem como é o Brasil, a música cumpre um papel fundamental de disseminação de ideias, cristalização de expressões e falares regionais e - mais importante - de perpetuação da musicalidade e beleza inerentes a nossa amada, inculta e bela Língua Portuguesa.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

A Prova dos Três

The Killers, The Strokes, Kaiser Chiefs e Arctic Monkeys. Todas, bandas jovens. Todas, já em seu terceiro disco. E a pergunta que não quer calar é a seguinte: o que ficou do brilho e do talento demonstrado no primeiro disco?
As respostas variam de uma para outra banda, mas é inegável que nenhuma delas repetiu os resultados empolgantes do primeiro trabalho.O The Killers, que esteve este final de semana se apresentando em São Paulo , lançou em 2004 o cd Hot Fuss, um dos melhores daquele ano, campeão de vendas e verdadeira fábrica de sucessos.
As expectativas em relação ao segundo eram, naturalmente, muito grandes. Sam’s Town, de 2006, não decepcionou quanto aos singles de sucesso. Estão lá belas canções como When You Are Young, Bones e Read My Mind, mas falta a unidade do disco anterior.
Ainda assim, eu me mantive com fé em Brandon Flowers e seus companheiros. Fé que se despedaçou em Day And Age, um trabalho anêmico que apenas chafurda nos bons sons dos anos 80. Para mim, não se salva nada.Já o Kaiser Chiefs surgiu como um verdadeiro furacão no cenário estagnado do rock inglês e lançou, em 2005, o ótimo Employment.
Puxado pelo grito de guerra chamado I Predict A Riot, o disco reeditou os melhores momentos do britpop, ao mesmo tempo em que citava influências de Beatles, Kinks e The Jam.
A mágica durou pouco. Os discos seguintes dos Chefes são imitações apagadas do esplendor de sua estréia.
No caso do The Strokes, o grupo novaiorquino parece nunca ter conseguido fazer jus a seu auspicioso début. Is This It causou furor entre críticos, modernos e jovens roqueiros.
Eu, particularmente, não vi motivo para tanto barulho. Para mim, eles apenas reciclam o som de garagem de gente como The Stooges, Velvet Underground e The Modern Lovers. Sem a mesma criatividade, diga-se de passagem.
Nos trabalhos seguintes, o que já era diluição virou pura repetição. Mas para não dizerem que tenho má vontade com o grupo, até gosto um pouquinho do segundo disco, Room On Fire.
Finalmente, deposito grandes esperanças no Arctic Monkeys, grupo de jovens ingleses que se beneficiou de ampla propaganda via My Space e surgiu como uma das grandes promessas do rock britânico feito nos anos 2000.
O primeiro disco é ótimo, o segundo não é nenhuma maravilha, mas também não é nenhum horror e o terceiro...
Bem, o terceiro já está na estante esperando sua devida apreciação. De qualquer maneira, tendo sido produzido por Josh Homme (o homem por trás do ótimo Queens Of The Stone Age), espero, no mínimo, um grande disco de rock.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Vampiros de Plástico

O que faz um produto – um filme, um disco ou um livro – se tornar um fenômeno de massa? Pode ser o tema explosivo (caso da polêmica tola em torno de O Código Da Vinci), o apelo sexual (aqui os exemplos são inúmeros, indo de Madonna até a nossa querida Gretchen) ou mesmo o simples sensacionalismo da mídia (a “artista” conhecida como Lady Ga Ga é um caso bem recente de exploração exagerada de pseudo-escândalos e ousadias feitas sob medida para os tablóides do óbvio).

Mas para explicar alguns fenômenos, só mesmo um bom psicólogo.

É o caso da série de filmes da saga Crepúsculo. Os livros que os originaram são best-sellers mundiais que já fizeram fortuna para a escritora Stephenie Meyer. A trama recicla clichês de histórias de vampiros com clichês de dramas adolescentes. Ou seja, haja lugar comum.

Mas o fato é que pegou. As garotas, sobretudo, sentem-se identificadas com a protagonista apaixonada por um rapaz enigmático, que acaba se revelando um vampiro sensível e bonzinho.

Passei batido pelos livros. Talvez porque já esteja um pouco velho para dramas plastificados ou talvez porque já tenha tido minha dose de chupadores de sangue.

Quando li os livros de Anne Rice sobre o cultuado vampiro Lestat, confesso que vivi uma fase de profundo interesse pelo tema. Isso sem contar os milhares de filmes vampirescos que se acumulam em minha memória, que vão desde o antológico Drácula, estrelado por Bela Lugosi, até os deliciosos pastiches da produtora inglesa Hammer. Como tudo na vida passa, isso também passou.

Mas resolvi dar uma chance à versão cinematográfica do primeiro livro da série, dirigido por Catherine Hardwicke e lançado em 2008. Durante longas duas horas, lutei para me manter acordado diante de tamanha bobagem. Atores sofríveis, história risível, direção apática e uma falta de emoção tão gritante que se chega a pensar que todo o projeto foi feito realmente por mortos-vivos.

No dia seguinte à sonolenta experiência, entro numa banca e escuto duas garotas namorando, embevecidas, uma revista com o casal do filme estampado na capa. A falta de vocabulário típica dessa fase da vida impedia as "fofas" de expressar melhor seu imenso amor pelo ator Robert Pattinson, que faz o vampiro meigo.

Rendi-me, então, a um fato muito simples: enquanto houver adolescência, hormônios em ebulição e fotoshop de última geração, os Crepúsculos da vida continuarão a florescer.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Da Estante

Sei que falo muito de Beatles por aqui e, com o perdão de quem não gosta, vou pedir licença para falar mais uma vez.

É que estou lendo a monumental biografia do grupo escrita por Bob Spitz (The Beatles – A Biografia, Editora Larousse).

Ao longo de quase 1000 páginas, o autor reconstrói a carreira da banda de rock mais popular de todos os tempos, de uma maneira detalhista, vívida e cativante.

Embora esteja ainda no primeiro quarto do livro, já dá para perceber a formação da personalidade de cada um dos quatro cavalheiros de Liverpool: a vida familiar conturbada de Lennon, o talento precoce de Paul, os péssimos boletins escolares de Harrison, as primeiras namoradas, a chegada do rock na Inglaterra, a dificuldade do dia-a-dia no pós 2ª Guerra Mundial, enfim, tudo o que viria a se refletir nas letras e atitudes de cada um deles se encontra ricamente descrito.

Altamente recomendável não só para fãs de carteirinha como também para aqueles curiosos em conhecer melhor um período muito fértil para a música jovem no mundo todo.

No quesito biografias de músicos, aliás, as nossas livrarias ganharam dois novos títulos que devem despertar bastante interesse: Minha Fama de Mau, de Erasmo Carlos (Editora Objetiva) e Nem Vem Que Não Tem – A Vida E O Veneno De Wilson Simonal (Editora Globo), de Ricardo Alexandre.

Esta última imagino ser imperdível, afinal a trajetória desse grande cantor brasileiro mistura preconceito, popularidade, talento, arrogância, ingenuidade e decadência num mesmo coquetel explosivo. É para ler escutando Sá Marina e Nanã.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O Queen do Século XXI

O rock nasceu como música inconsequente, trilha sonora para bailinhos suarentos e diversão para garotos e garotas suburbanos.

É claro que, nos revolucionários anos 60, tudo isso mudou e críticos e estudiosos sérios começaram a ver na nova música uma forma de expressão artística bastante representativa de sua época.

Discos como Revolver (The Beatles, 1966) e Pet Sounds (The Beach Boys, 1966) mostraram todo o potencial e riqueza musical que o rock podia trazer em canções simples de três minutos.

Só que alguns músicos não se contentam com pouco. Para eles, não basta compor melodias grudentas, ritmos irresistíveis e letras inesquecíveis. É preciso dar ao rock uma fachada de complexidade que o aproxime de coisas mais socialmente aceitas como a música clássica e o jazz.

Uma bobagem, é claro, mas dessa ambição nasceram grandes discos como Fragile (Yes, 1972), Larks Tongues In Aspic (King Crimson, 1973) e A Night At The Opera (Queen, 1975).

O furacão punk tratou de varrer da face da terra tais delírios de grandeza, mas volta e meia aparece uma banda que ressuscita essa estética de exageros, com resultados mais ou menos interessantes.

Curiosamente, a melhor ópera rock dos últimos anos foi gravada por um grupo que começou se apropriando da estética punk e fazendo, portanto, discos muito rápidos e diretos, o Green Day. American Idiot, lançado em 2004, fez uma raivosa radiografia dos anos Bush, num conjunto de canções que se ligam e formam um todo coeso e intenso. Não por acaso é o melhor disco do trio.

Recentemente o Green Day tentou repetir a fórmula no menos inspirado 21st Century Breakdown. Batendo perto dos 80 minutos – se fosse nos anos 70, seria um duplo -, não chega a ser um disco ruim, mas também não chega a empolgar.

Agora, quem gosta de muito piano, refrões bombásticos, vocais dramáticos, canções que se dividem em vários movimentos, não deve deixar de checar o trabalho da banda britânica Muse.
Verdadeiro gigante lá pelas ilhas – comparáveis atualmente a Oasis–, o Muse ainda não atingiu o mega sucesso mundial de um Coldplay, mas segue gravando discos em que chupa descaradamente a estética operística do Queen, revestindo-a com um tratamento moderno e produção de última geração (o que o Queen, se a gente for pensar bem, já fazia com os recursos de sua época).

O auge do estilo melodramático metido a besta do Muse foi atingido com o excelente Black Holes And Revelations, de 2006. Nele, o cantor e compositor Matt Bellamy conseguiu equilibrar perfeitamente sua veia erudita com seu inegável talento para compor boas músicas pop.

No novo disco, The Resistance, sai o afiado artífice pop e fica apenas o compositor erudito frustrado. É tanto piano, coro, pausas dramáticas e vocais afetados que, lá pelas tantas, a gente fica achando que está escutando a mesma música repetidas vezes. E, no final, descobrimos que essa impressão é verdadeira. As três últimas músicas são uma sinfonia dividida em três partes. Funciona? Para mim, não.

Nas três primeiras faixas do disco, o Muse continua mostrando que tem garra e habilidade para fazer um bom disco de rock. Uma pena que a ambição desmedida de Bellamy o faz esquecer que ele deveria ficar somente nisso.