quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A Última Flor

Há muito se discute sobre as reais qualidades literárias de uma boa letra de música. É poesia ou não? A coisa se complica muito quando música e texto de altíssima qualidade andam de mãos dadas. É o caso de grande parte da música brasileira.

Uma recente enquete da edição nacional da revista Rolling Stone revelou que Construção, música e letra de Chico Buarque, é a melhor canção brasileira de todos os tempos.

Se formos analisar os versos de Buarque, fica muito claro que a eleição de sua obra-prima, de 1971, deve muito à rica construção gramatical, cheia de versos terminados em palavras proparoxítonas, e suas metáforas asfixiantes da dura realidade do Brasil dos anos de chumbo.

É lógico que o incrível arranjo, que evolui de um simples samba para um épico cinematográfico em brilhante tecnicolor, torna a canção ainda mais impressionante, mas quando pensamos em Construção nos vem imediatamente à cabeça A Letra.

Para mim, não há mistério. Não consigo ver muita distinção entre Carlos Drummond de Andrade e a melhor produção de Caetano Veloso ou entre a depuração lingüística de João Cabral e o intricado universo de Chico Buarque.

Algumas letras de Antonio Carlos Jobim me emocionam tanto quanto os versos tristes alegres de Manuel Bandeira.

As palavras de Renato Russo tiveram um impacto tão grande em minha psique quanto os versos românticos de Álvares de Azevedo e Castro Alves.

Penso que, num país de analfabetos e alfabetizados que não lêem como é o Brasil, a música cumpre um papel fundamental de disseminação de ideias, cristalização de expressões e falares regionais e - mais importante - de perpetuação da musicalidade e beleza inerentes a nossa amada, inculta e bela Língua Portuguesa.

3 comentários:

gentil carioca disse...

Concordo de A a Z.
E lembremo-nos, também, de quando versos são musicados sem perder sua formosura.
Imagine "Canteiros", por exemplo, de Cecília Meireles, em vozes menos berrantes que a de Fagner...
abços

Thais Miguele disse...

Começar a acompanhar seu blog pra fazer de conta que entendo de música quando surgir em uma conversa.
Sara Tavares, conhece? Uma cantora congolense interessante.

Luis Valcácio disse...

Thais, gostar de música já é entender. E a gente sempre conhece artistas e discos que outros desconhecem, não é mesmo? Eu, por exemplo, não conheço nada da música do Congo. Então, está anotada a dica. Grande abraço e volte sempre...
Querida Carioca, vou discordar de você em um pequeno aspecto: amo de paixão a versão de Fagner para Canteiros. Penso que ele encontrou a musicalidade perfeita para os versos inesquecíveis da grande Cecília Meireles. Até a voz de "taquara rachada" do músico cearense está adequada. Ou você consegue imaginar outro intérprete? Quem seria?