quarta-feira, 20 de maio de 2009

Tragédia Revisitada

Poeta, homossexual assumido, marxista convicto e cineasta inquieto, o italiano Pier Paolo Pasolini dirigiu alguns dos filmes mais interessantes da segunda metade do século XX.

Sua carreira contempla estilos diferentes, indo do cinema de temática social fortemente influenciado pelo neo-realismo, até adaptações de clássicos da literatura e de tragédias gregas.

Entre estes últimos, estão sua releitura muito pessoal de Medeia – estrelado pela cantora lírica Maria Callas – e de Édipo Rei.

A história de Édipo – o filho que mata o pai e se casa com a própria mãe –, é uma das mais conhecidas da tragédia clássica, muito graças às teorias de Freud, que se apropriou do mito grego para fundar a Psicanálise.

Justamente por isso, é interessante conhecer a visão de Pasolini.

Sem um respeito exagerado por um texto tão caro ao inconsciente coletivo do Ocidente, mas, ainda assim, mantendo-se fiel à trajetória do herói helênico, Pasolini nos apresenta um Édipo intenso, vivo e real.

É também curiosíssima a opção da transposição da Grécia Clássica para um deserto bárbaro, onde profecias terríveis acontecem em meio a danças tribais e assassinatos sangrentos são presenciados por deuses mudos.

A profunda compreensão do cineasta de que o terreno da tragédia é, na verdade, a alma humana, se traduz em imagens de grande impacto.

Daí, talvez, o deserto, o ermo, o horizonte perdido em que Édipo vaga desesperado ao final de seu drama.

Cego, humilhado e perdido para sempre, Édipo é nós todos: seres ridículos tateando no escuro da existência.

3 comentários:

Afonso C. disse...

Que abordagem mais verdadeira, mais intensa.
Bonita escrita, meu caro Luis.
Parabéns.

Anônimo disse...

luis valcácio comentando pasolini, o cineasta, em Édipo Rei (1967) e Medéia (1969). maravilha! texto enxuto e preciso, um prefácio apropriado para aqueles que pretendem se aventurar no universo de um dos mais inquietos diretores de cinema do século 20. sei que o blogue é sobre o mundo da música - sinto que ivete sangalo irá a qualquer momento levantar a poeira por aqui - mas adoro suas palavras sobre cinema e literatura, afinal toda arte é, de certo modo, musical. a sétima arte em particular.
lázaro luis lucas
brasília-df

Afonso C. disse...

"Poeira, Poeira", delícia cremosa de encanto baiano em paragens valcacianas. Não vejo a hora de tais bombásticas abordagens. Treimei, meu jovem Lázaro Luis, tremei...
E viva o Cid Moreira ao piano alternativo...